terça-feira, 8 de julho de 2014

Relato de Parto do Pedro



O parto do Pedro começou na gestação da Luisa. Aliás, começou antes, começou desde a minha infância ao ouvir o relato do meu próprio nascimento. Já relatei ambos uma vez, então não o farei de novo. Quem quiser pode ler aqui.
Desde que a Luisa nasceu, num parto natural hospitalar super rápido, eu fiquei me perguntando porque raios eu tinha saído de casa e ido ao hospital só para pari-la! Ainda mais porque em minha casa se encontrava uma parteira super experiente. Enfim, marinheira de primeira viagem, falsas certezas e alguns receios me cercavam a época. Fato é que após o nascimento dela eu conheci muita gente que pariu, muita gente que tentou parir e muita gente que queria muito e muito mesmo parir de novo só pra fazer tudo diferente.
Vivi o dilema de desejar mais a outro parto, (que superasse o primeiro, mesmo não tendo sofrido violência obstétrica) do que outro filho. E esse dilema é tão comum entre as mulheres! A vontade de viver toda a experiência de novo, e de mudar alguma coisa, e de se reencontrar consigo mesma, de curar feridas, etc.
Porém, eu, racional que sou, sabia que com o novo parto viria um bebê e a responsabilidade de criá-lo, educá-lo e deixá-lo pro mundo, que era o que mais me preocupava e apavorava.
Para mim, parir era a parte fácil e gostosa da história. Depois vinha o difícil. Então, esse bebê foi sendo adiado, e planejado, e adiado, até que ele se manifestou. Não lembro se ele já existia em meu ventre quando o sonho aconteceu, mas eu descobri que estava, ou estaria grávida em breve, por meio dele.
Foi um sonho lindo, reconfortante, gostoso de sonhar. Eu estava em uma casa no campo, como eu sempre desejei ter, e aparecia um garotinho lindo, pele branquinha, cabelos bem negros, e passeava pela casa de mãos dadas comigo. No final do sonho ele me deu um quadro de presente, era uma pintura de duas crianças de mãos dadas, ele e uma menina mais velha que ele, muito parecida com a Luisa e comigo mesma quando criança. Então, depois de me entregar o quadro ele se despedia de mim e dizia: “Estou voltando!”
Acordei emocionada e fiquei atenta, até que notei a menstruação atrasada, enrolei, fiquei com medo e acabei cedendo e fiz um teste de farmácia: positivo! Euforia e pânico tomaram conta de mim. Era o pior momento de nossas vidas para termos um filho. Mudanças no orçamento doméstico, uma provável mudança de casa, talvez de cidade a caminho. Muito medo se abateu sobre mim. Medo de dar tudo errado, do parto que eu passei tanto tempo desejando não acontecer, de só vir o filho, claro já muito amado. Mas o parto, ah o parto era MUITO IMPORTANTE!
Eu tinha medo de ser agredida durante o nascimento do meu filho, de ficar marcada pra vida por causa disso, de ter dificuldade de criar vínculo com ele por causa disso. Com isso, a gravidez foi pesada emocionalmente, triste, cansativa, arrebatadora.
Eu queria fugir de mim e do mundo, quis me separar, quis fugir, quis ficar dormindo a gravidez inteira, mas eu tinha uma filha para cuidar e foi por ela que eu não sofri ainda mais. Foi ela quem iluminou essa gravidez, ela e ele.
Eu tinha um desejo de não saber o sexo do bebê antes do parto, queria a surpresa, mas estava solitária nesse pensamento. Pai e restante da família queriam saber o quanto antes, então eu quis saber também, antes ser a primeira que a última, não é?
E então descobrimos que viria um menino. Na verdade, confirmamos, afinal o instinto já dizia que era isso mesmo. E o nome já estava escolhido: Pedro.
Eu sabia que uma gravidez saudável poderia chegar a 42 semanas. Foi assim da primeira vez, então quando me perguntavam para quando era o bebê eu dizia a proximidade da data de 42 semanas, a fim de evitar pressões desnecessárias e cruéis no final da gestação.
Como queríamos um parto domiciliar, contatamos uma parteira, a mesma que me acompanhou no parto da Luisa, e combinamos tudo com ela. Quis o destino, contudo, que ela não pudesse nos acompanhar, devido a dificuldades pessoais e profissionais dela, nada relacionadas a mim ou a gravidez.
Ainda não sabíamos quem acompanharia o parto e o primeiro susto grande aconteceu: uma cólica muito forte, uma contração fortíssima do útero e um sangramento abundante. Não era nada demais, no fim, mas o susto serviu pra deixar claro a mim mesma que: sim, eu desejava aquele bebê, eu queria aquele filho, eu amava Pedro desde já.
A gravidez seguiu tranqüila, ao menos no aspecto físico, encontramos nossa equipe para nos acompanhar no parto, uma enfermeira, uma doula, uma obstetra e uma neonatologista. Todas mulheres fortes, francas, de energia contagiante. A certeza de que Pedro chegaria ao mundo da maneira mais tranqüila e segura nos preenchia a cada semana que passava.
Até que chegou o dia 9 de abril, 40 semanas, e eu acordei com muitas cólicas, razoavelmente fortes. Avisei as amigas, avisei a equipe e aguardei. O dia foi passando e as novidades iam chegando: tampão mucoso com rajadas de sangue, diminuição do intervalo das contrações, aumento da intensidade.
E nesse meio tempo me lembrei da fotógrafa que tinha combinado um ensaio de gestante comigo e ainda não tínhamos realizado. Liguei pra ela e fizemos o ensaio, em pleno trabalho de parto latente.
Aproveitei o dia para limpar e arrumar a casa, tentar deixar o que desse pronto para a chegada do Pedro e despedir da gravidez, da Luisa como filha única, de mim como mãe só da Luisa. O dia foi longo.
À noite, quando consegui dormir, acordei sobressaltada com a ausência de contrações e pensei: alarme falso! Não era trabalho de parto, eram pródromos. Mesmo já tendo passado por um TP, eu havia me enganado. Fiquei ansiosa. Tentei descontrair e então notei que elas estavam lá, ainda ritmadas, mas um tanto leves e quase indolores. O torpor do sono as tornou imperceptíveis momentaneamente.
Luisa ainda não tinha dormido. Tratei de botá-la a dormir, o que só aconteceu por volta de meia-noite. Deitei com ela em nossa cama, ela adormeceu finalmente e eu senti a primeira contração verdadeiramente dolorida da minha vida. Estava deitada de barriga pra cima e a dor me paralisou momentaneamente. Imaginei as mulheres que são obrigadas a parir nessa posição e lamentei por elas.
Levantei-me, fui ao outro quarto onde o espetáculo ocorreria. Não tinha anda montado: banheira, forro plástico, câmara fotográfica, nada!
Mas eu consegui apenas fazer download de um contador de contrações, contar as contrações e tentar acordar o pai. Pensei na doula, desejei que ela estivesse ali, mas não conseguia procurar o telefone e ligar pra ela. Pensei na parteira, mas achei que fosse cedo pra chamá-la.
Sim,eu já tinha parido, mas tudo foi muito diferente, e mesmo eu contraindo de 5 em 5 minutos, com contrações durando cerca de 1 minuto, achei que ainda fosse levar mais tempo para tudo acontecer. A Luisa nasceu 4 horas depois da primeira dor, Pedro eu esperava pelo menos umas 3 horas de trabalho de parto.
Mas, foi tudo muito rápido. De 10 em 10 minutos, 7 em 7, 5 em 5. O pai não acordava, eu não conseguia chamar mais ninguém. Muita dor, alucinante. E mesmo conseguindo manter um pouco de pensamento racional, o instinto me dominou.
Quando o pai finalmente acordou, não dava mais tempo de nada. Ele chamou equipe, ele tentou me massagear, e me deu apoio. Mas foram 20 minutos que mais pareceram 20 segundos. Do sofá onde eu estava para o vaso sanitário, do vaso ao chuveiro e do chuveiro a baqueta de parto.
Companheiro correndo de um lado pro outro, telefona, abre porta, avisa porteiro, acode Lusa acordando, me aquece, me conforta, acode Luisa de novo, ate que:
- Tudo bem?
- Tá nascendo!
Sim tinha me tocado e sentido a bolsa amniótica saindo pelo canal. Aparei meu períneo. Foi instinto. Em pouco tempo a bolsa foi se preenchendo com a cabeça de Pedro, e em duas contrações ele estava em nossos braços, aparado pelos pais.
E foi assim, que sozinhos, Rafael e eu parimos nosso filho. E esse momento durará para sempre em nossas lembranças. Momento de emoção pura, e tranqüilidade surpreendente.
A parteira e a doula chegaram cerca de 5 minutos depois, atestaram a saúde e o bem-estar de todos.
Pedro já estava mamando. E pegou certo desde o primeiro instante e mamou intensamente por longas horas.
A placenta demorou um pouquinho a sair, mas estava íntegra, intacta e bela. Eu não quis guardar para nenhum ritual, porque quem em conhece sabe que sou uma pessoa prática e nada ritualística. Mas era uma bela duma placenta, e fiquei encantada por ela!
O parto do Pedro foi assim, intenso, determinado, porque assim é Pedro. Sua personalidade impregnou todo o momento e desde então temos tido o prazer e a alegria de conviver com tão generosa, carismática e cativante criatura.

Pedro, nos te amamos, e amamos teu nascimento! Foi a experiência mais significativa de nossas vidas! Muitíssimo obrigada!