sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Os filhos que deixaremos ao mundo

Corria o menino a brincar. De olhar atento a mãe acompanhava a certa distância segura, mas de forma a não intervir demais na imaginação do menino. Ele criava personagens e cenários fantásticos, mudava a voz e fazia ruídos tornando aquela realidade cinza e chata em um mundo colorido e mágico.  mãe observava a sorrir. Todas as dificuldades, todos os esforços, todas as dores que superara nesses últimos 4 anos passavam de relance por sua mente. Mas ao ver o resultado, aquele filho feliz e imaginativo, ela sentia a capacidade de sorrir, um sorriso quase que da alma.
Em sua cabeça, uma imagem de futuro ia se formando. Imaginava o filho a crescer e a tornar-se um cidadão generoso, pacífico, de senso crítico e olhar bondoso. Imaginava-o de diversas formas, tamanhos, idades, escolhendo profissões diversas, namorando pessoas diversas, mas uma constante: era feliz E o era, não porque assim o deseja todas as mães, mas sim porque teve seu tempo de criança respeitado para sonhar e criar livremente, aprendendo as coisas da vida a brincar.

Pensava em todos os privilégios que teve ao poder criá-lo dessa forma. Mesmo tendo que estar ausente parte do dia, mesmo tendo que trabalhar tão duro e pesadamente, e por vezes perdendo momentos incríveis, tinha uma certeza: era bem cuidado. Em sua ausência, faziam o papel de cuidá-lo de forma como ela mesmo faria se presente pudesse estar. E por isso era muito grata.

De repente, foi desperta de seus devaneios, por uma voz grossa e grosseira que dia de forma ríspida:

"Esse menino precisava era apanhar mais!"

O despertar abrupto e bruto a fez pensar que tinha mal entendido a intervenção não desejada. Com um semblante de surpresa e dúvida, ela olhou pro lado e viu aquele homem. Sofrido, bruto, carrancudo. Infeliz. E ele ao perceber seu olhar, repetiu, complementando:

"Menino tem que apanhar muito e desde cedo. Mais até do que menina. Que é pra crescer forte, virar homem!"

Por um momento, ela hesitou. Pensou em contra-argumentar. Pensou em dar um discurso filosófico abrangente com citações a referências mil, o qual estava até bem acostumada. Pensou em ofender o homem, em pegar seu filho pela mãe e tirá-lo dali, para que não ouvisse tamanho absurdo. Pensou em citar leis e normas morais. Mas, se acalmou.

Inspirou o ar profundamente, soltou calmamente pela boca. Sorriu.

 "E vc apanhou muito, foi?" perguntou ao intrometido. ao que ele respondeu afirmativamente.
 "Por isso ficou assim?" Ele olhou-a como sem entender se era um elogio "Assim como? Muito macho?" disse.
"Não, assim cheio de idéia errada, com semblante triste, de gente sofrida, com essa cara de vítima da vida! Quero isso pro meu filho, não, moço. O meu vou criar com amor pra ser uma pessoa iluminada, de sorriso franco e caridade no coração! Mesmo que não se torne forte fisicamente, será com certeza muito forte emocionalmente, que é o que importa de verdade!"
E seguiu seu caminho, ao lado do filho que nada tinha percebido do que ocorrera, pois estava em seu mundo particular.


Imagem daqui.